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24 de out. de 2016

Varejo: Primeiro Trimestre de 2017

O mês de outubro de 2016 vem se revelando particularmente ruim para o comércio, com desempenho muito pior do que se poderia esperar. É o que venho percebendo no acompanhamento de situações reais - e não pela análise de índices econômicos agregados e defasados.


 Pois bem, tal situação me lembrou o seguinte:
Em 1998, eu trabalhava numa fábrica de móveis. No início do último trimestre daquele ano, faltavam pedidos e as vendas no comércio estavam fracas. Isso não era normal, por se tratar de um mercado sazonal, que historicamente registrava alta de vendas no final do ano e programação de entregas por parte dos lojistas.
No entanto, a partir da segunda quinzena de novembro a situação mudou. Lembro que um supervisor de vendas chegou a comentar que os lojistas "nunca venderam tanto".
Porém, com a chegada do primeiro trimestre de 1999, a queda das vendas foi brutal, mesmo considerando a sazonalidade.
Minha explicação: em 1998 o Brasil atravessava um período de turbulência e desconfiança econômica, sofrendo impacto da crise na Rússia. A taxa de juros era elevadíssima (a Selic chegou a passar de 40% a.a.!), o desemprego era alto e havia grande desconfiança quanto aos chamados "países emergentes", com notícias econômicas negativas afetando a confiança de consumidores e investidores.
Nesse cenário, as vendas no final de 1998 aumentaram por reflexo, por tradição (período natalino, sazonalidade), pela liberação de uma intenção de consumo que estava represada. E, com a chegada de 1999, a situação se estabilizou no patamar real, que era um cenário muito ruim.
Algo semelhante pode ocorrer para o final de 2016, afetando a indústria e o comércio de bens duráveis (principalmente). Senão vejamos:
A taxa de juros é alta, mas não tanto quando no período da crise da Rússia. Porém, o desemprego parece ser maior - diante de revisões realizadas pelo IBGE, o desemprego atual atinge 13,6% das pessoas com idade para trabalhar (cerca de 22 milhões - e não me surpreende se esse número for ainda maior).
Além disso, passamos por um cenário de políticas econômicas desastrosas, só comparável aos planos mirabolantes da época do presidente Collor, com o país atravessando um período de grave recessão. E temos, neste fim de ano, situação de estados e prefeituras quebrados, em dificuldade para pagar salários. Por fim, a instabilidade política, embora menor, ainda deve continuar - há uma necessidade de retomada de confiança do governo federal, que leva tempo e está sujeita a incertezas.
Portanto, quem acompanha a economia real, e não apenas indicadores econômicos defasados e gerais, há de concordar que a situação de crise não passou e que estamos ainda no fundo do poço, principalmente nos setores de bens de consumo duráveis.
Assim, fazendo uma analogia comedida, considero que o final de 2016 e começo de 2017 terá cenário de vendas com viés semelhante ao da transição 1998-1999.
O comércio de bens duráveis verificará aumento nas vendas apenas no período final do ano (a partir da segunda quinzena de novembro, principalmente), em retomada do consumo que no momento está represado. No entanto, preparem-se para um primeiro trimestre de 2017 muito difícil para o segmento de bens de consumo duráveis - talvez até o pior de todos os tempos.
Depois, porém, há perspectiva de melhora gradual. A projeção atual, de crescimento do PIB por volta de 1% para 2017, é modesta porque a base de comparação é baixa (dada a hecatombe econômica que se verifica desde 2014) e porque há mudança de perspectivas (salvo o surgimento de novas turbulências decorrentes de instabilidade política). 

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